segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Tópicos sobre as fases do pensamento de Nietzsche

Introdução

• Objetivo da filosofia de Nietzsche: realizar um diagnóstico fiel da situação do homem moderno.

• Homem moderno: confiante no deus Logos (= razão) e nos seus produtos: ciência e técnica; relativiza valores como justiça, bem, mal, virtude.

• A partir deste perfil do homem moderno Nietzsche propõe:

a. compreender como este otimismo na razão, no progresso do conhecimento, à relativização dos valores.

b. Criticar o otimismo da razão demonstrando os seus limites e denunciar as formas que o homem usa para fugir da visão dos perigos de sua condição.

c. A partir da constatação da relativização dos valores propor outros valores

• Nietzsche propõe o fim da metafísica: a metafísica divide o mundo em dois: Platão (mundo sensível/mundo inteligível), Kant (o que é em si = noumenon; o que é para a razão humana = fenômeno); cristianismo (mundo terreno / mundo celeste)... Nesse dualismo o mundo sensível, o fenômeno, o mundo terreno são mais degradados, menos importantes, são os mundos da aparência. Nietzsche rejeita este dualismo. É impossível um conhecimento que deixe de lado nossos afetos, o sensível. Todo conhecimento é resultado da projeção de nossos impulsos e anseios e por isso é determinado por uma perspectiva individual e sociocultural. Então questiona o valor absoluto da verdade tanto no campo da ciência como no campo da moral. No campo da moral vai colocar em questão o valor dos valores, vai julgar o valor dos valores como o bem, o mal, o justo, o injusto, o lícito e o proibido, etc..

• A filosofia de Nietzsche tem três fases: 1870 a 1876 / 1876 a 1882 e 1882 a 1889


1ª Fase da filosofia de Nietzsche: 1870 e 1876

Obras deste período: "Nascimento da Tragédia a partir do espírito da música’ (1872), "Schopenhauer como Educador’ (1874), "Sobre o futuro de nossas instituições de Ensino" (1872)

• Questão central desta fase: destino da arte e da cultura no mundo moderno. Nesta fase é muito influenciado pelo filósofo Schopenhauer

• Voltando o seu olhar para a Grécia antiga, antes do filósofo Sócrates, propõe uma outra experiência contrária ao cientificismo otimista dos tempos modernos.

• A arte, especialmente a música, seria a forma de restaurar a experiência trágica da vida vivida pelos gregos antigos que não dividia o mundo em dois e por isso não desvalorizava a vida. A vida era vivida no seu todo: com as afeições, instintos, o sensível, a morte, o sofrimento, as alegrias e prazeres.

• Transformaram em beleza, em arte (teatro, música, arte política) os horrores da existência a partir de dois princípios: princípio apolíneo (ligado ao Deus Apolo) e princípio dionisíaco (ligado ao Deus Dionisio)

• Apolo é o Deus das artes figurativas. O impulso apolíneo expressa a ordem, o equilíbrio, a justa medida.

• Dionisio é o Deus da música. O impulso dionisíaco expressa a transgressão de todo limite, a destruição de toda figura.

• Porém esta vivência da tragédia começa a desaparecer com o surgimento da filosofia de Sócrates (bastante criticado por Nietzsche): inicia-se um processo de valorização da razão com os seus produtos como a ciência e a técnica pretendendo fugir do lado trágico da existência. Não se suporta o que é incompreensível pela razão: o absurdo da existência.

• No entanto esta visão não trágica da vida entra em crise principalmente com o filósofo Kant que demonstra que Deus, liberdade e imortalidade da alma não podem ser explicados pela razão científica ou teórica.

• Nietzsche acredita nesta fase que a união da música de Richard Wagner com a filosofia de Schopenhauer possibilitaria o renascimento da cultura trágica alemã.

• De forma geral para Nietzsche a cultura e a arte seriam a redenção da natureza e da vida. Ajudariam a diminuir a violência e agressividade humanas destrutivas. Significam a organização do caos, a sublimação das forças agressivas (destrutivas) do homem. (atenção: o termo sublinhado lembra Freud). Transforma monstros selvagens em animais domésticos.

• Nietzsche não acredita que uma organização social por mais perfeita que fosse fizesse desaparecer a violência na sociedade.


2ª fase da filosofia de Nietzsche: 1876 a 1882

Obras desta fase: "Humano demasiado humano" (1878), "Aurora: pensamentos sobre os preconceitos morais" (1881), "A Gaia Ciência" (1882)

• Nesta fase valoriza a ciência:

"O homem científico é o desenvolvimento do homem artístico". (Humano, Demasiado Humano, I, aforismo 222; em KSA. Vol. 2; p. 185 s.)

Nietzsche vê agora a ciência como elemento importante para se chegar ao essencial da vida. Abranda a oposição entre ciência e arte (cultura). O conhecimento científico torna o homem livre.

"A felicidade do homem do conhecimento aumenta a beleza do mundo e torna mais ensolarado tudo o que é; o conhecimento espalha sua beleza não apenas em torno das coisas, como também, com o tempo, dentro das próprias coisas" (Aurora, V, aforismo 550; em: KSA. Vol. 3; p. 320 s.)

• Estuda muito nesta fase as ciências naturais e a biologia. Porém no livro "Gaia Ciência" (gaia = alegre) já aponta para uma ciência que deve ser "alegre", ou seja, não dogmática, sem rancores, que se esforça por multiplicar as perspectivas.

• Método genealógico: é o método científico que usa para descobrir a origem dos valores morais. Genealógico porque pretende reconstituir historicamente os momentos do vir a ser dos valores.

• A explicação genealógica revela que não existem contrários, desaparece as antíteses entre pólos opostos, a idéia de entidades estáveis: o bom se transforma em mal, o belo em feio e vice versa. O mundo está em constante transformação, é um vir-a-ser (ou devir)

• "Não existe um agir não egoísta, nem uma contemplação desinteressada; ambas são sublimações, nas quais o elemento fundamental, quase volatizado, demonstra-se como existente apenas para a mais refinada observação" (Humano, Demasiado Humano, I, 1; em KSA. Vol. 2; p. 21 s.)" (Observação: o termo sublimação lembra a psicanálise freudiana)

• "Quem contempla aqueles temíveis despenhadeiros escarpados onde geleiras se acumulam considera impossível que venha um tempo em que, no mesmo sítio, se instale um vale de relvado e floresta, com regatos. Assim também na história da humanidade: as forças mais selvagens abrem caminho, e, embora destrutivas, de início a atividade dela foi necessária para que mais tarde, um modo de vida mais suave aí ingresse sua morada. As energias terríveis – aquilo que se chama o Mal – são os ciclópicos arquitetos e construtores de caminho da humanidade" (Idem, 246; em: KSA. Vol. 2; p. 205)


3ª fase da filosofia de Nietzsche: 1882 a 1889

Obras desta fase: "Para além do Bem e Mal" (1886), "Para a genealogia da Moral" (1887)

• Outra obra muito conhecida desta fase é "Assim falou Zaratustra: um livro para todos e para ninguém" (1883 e 1885) que traz as preocupações fundamentais de Nietzsche como a desconstrução da metafísica, denúncia da hipocrisia moral, a importância da educação, a política e o destino da cultura, a crítica do Estado.

• Neste livro Nietzsche implode o dualismo metafísico que separa corpo e alma, matéria e espírito:

• "O corpo é uma grande razão, uma pluralidade dotado de um sentido, uma guerra e uma paz, um rebanho e um pastor. Instrumento de teu corpo é também tua pequena razão, meu irmão, a que chamas ‘espírito’, um pequeno instrumento e um pequeno joguete de tua grande razão. Instrumentos e joguetes são o sentido e o espírito; por detrás deles está, porém, o si mesmo. Por detrás de teus pensamentos e sentimentos, meu irmão, encontra-se um soberano poderoso, um sábio desconhecido – ele se chama si mesmo. Em teu corpo habita ele, ele é o teu corpo" (Assim Falou Zaratustra, I. "Dos desprezadores do Corpo"; em KSA. Vol. 4; p. 39 s.)

• Neste livro refere-se ao homem moderno como o "último homem" que se define como o homem que crê na onipotência do seu saber e agir, pela sua mediocridade, pela sua busca de conforto e bem estar fugindo sempre da vivência trágica da vida.

• "‘ Nós inventamos a felicidade’ – dizem os últimos homens, e piscam os olhos. Nenhum pastor e um só rebanho. Todos querem o mesmo, todos são iguais.; Quem sente de outra maneira vai voluntariamente para o hospício..." (Assim falou Zaratustra. Prólogo; em KSA. Vol. 4, p. 19 s.)

• O além-do-homem (Observação: não se deve traduzir por "super-homem") é um conceito antagônico à figura do "último homem", é um contraideal da tendência ao nivelamento e à uniformização que caracteriza a sociedade moderna. O homem não é um fim mas um meio para se chegar ao além-do-homem. "A grandeza do homem está em ser ele uma ponte, e não um fim: o que se pode amar no homem é que ele é uma passagem e um crepúsculo." (Idem, p. 14 16)

• Para se chegar ao "além-do-homem" precisa-se de vontade de poder. (veja na apostila o seu significado)

• Eterno retorno: outro conceito presente no livro "Assim falou Zaratustra...". (veja na apostila o seu significado).

• "Somente quando o sofrimento não for mais vivido como uma objeção contra a vida e um motivo para condená-la é que o homem poderá superar seu desejo de uma além metafísico e seu rancor contra a passagem do tempo" (Oswaldo Giacoia Junior, Nietzsche, Ed. Publifolha, pág. 60) "O homem deve agir como se a mais íntima de suas ações devesse se repetir eternamente, de maneira a dar à sua própria existência a bela forma da obra de arte.’ (op. Cit., ibidem)

• Na obra "Genealogia da Moral...": conceito de niilismo. Por meio dele o homem moderno vivencia a perda de sentido dos valores superiores de nossa cultura. Sintomas deste fato: a arte instrumentalizada apenas para entretenimento; na política e educação como homem adaptado aos meios de produção.

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